Há 21 anos, pessoas com HIV coordenam instituição
O Grupo de Trabalho Em Prevenção Posithivo (GTP+) é o primeiro da região e atualmente o único em Pernambuco gerido por e para pessoas que vivem com HIV
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Por: Eduarda Nunes – Lupa do Bem / Favela em Pauta
O surto do HIV e a pandemia da aids datam da década de 1980, e uma década depois, em 1993, os medicamentos que tratam a doença (Zidovudina ou AZT) começaram a ser fabricados no Brasil. Junto a esse acontecimento, o Teatro da Prevenção em Pernambuco também começou a se desenvolver.
O grupo é formado por pessoas que vivem com HIV e que viram no AZT uma possibilidade de viver e não mais apenas esperar a morte por serem portadoras do vírus. Juntos, os cinco integrantes encenavam peças de teatro em vários locais levando mensagens com o objetivo de diminuir a discriminação e o preconceito.
Atualmente, somente dois continuam colaborando com a organização, os demais faleceram ou estão doentes por causa de enfermidades oportunistas que, em função do vírus em sua forma não tratada, têm maior predisposição ao agravamento de outras doenças devido ao enfraquecimento do sistema imunológico.
Em 1998, com apoio de um amigo de Wladimir Reis, hoje coordenador-geral do grupo, o Teatro da Prevenção começou a se organizar enquanto grupo de trabalho com encontros regulares. O grupo foi beneficiado pela ASW, instituição feminista alemã, que financiou dois anos do aluguel do espaço utilizado pelo grupo, bem como apoiou as ações e atividades direcionadas às pessoas que convivem com o HIV.
Em dezembro de 2000, o grupo se regularizou enquanto organização não governamental sem fins lucrativos com base comunitária, o Grupo de Trabalho Posithivo (GTP+).
“A necessidade de tornar protagonistas de suas causas grupos e sujeitos que historicamente são tratados como objetos de pesquisa, de projetos ou de intervenção estatal, aliados ao desejo de construir um terreno mais amplo para garantia dos direitos humanos em Pernambuco, motivaram a criação e desenvolvimento de nosso trabalho”, afirma Wladimir.
Atualmente, o GTP+ soma uma série de projetos, prêmios e participações políticas ao longo dos 21 anos de atuação. A captação de recursos da ONG se dá através dos editais de projetos públicos, privados ou internacionais e doações.
Feito por e para pessoas que vivem com HIV
Além do Teatro da Prevenção, o GTP+ atualmente também trabalha com outras ações, como os Mercadores de Ilusões, trabalho de conscientização e prevenção do HIV e outras IST, e atua no fortalecimento da autoestima de pessoas LGBTQ+, profissionais do sexo e população em situação de cárcere. Até hoje, os mercadores já conseguiram atender mais de quatro mil pessoas.
A organização atua nas frentes de promoção de cidadania, direitos humanos, prevenção e cuidados para os portadores de HIV. Além das ações de formação, a instituição também promove assessoria jurídica, psicológica e assistência social a quem procura acolhimento.
Em 2021, o GTP+ iniciou o curso de confeitaria em sua Cozinha Solidária, projeto que profissionaliza e emprega seus usuários na área da alimentação e também gera retorno financeiro para a ONG
Até o momento, o grupo de trabalho recebeu sete prêmios, incluindo reconhecimento internacional, por sua atuação.
HIV não é sentença de morte
Embora o tratamento para o HIV seja oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) há 25 anos e portar o vírus seja diferente de estar com aids, os portadores seguem sendo alvo de estigmas criados ainda na década de 80.
A medicina avançou ao ponto de tornar o vírus indetectável e intransmissível, mas a morte social e a falta de vontade política seguem fazendo dessas pessoas suas vítimas. Atualmente, 920 mil brasileiros portam o vírus e 94% dos que estão em tratamento não transmitem o vírus.
Iniciativas como a do Grupo de Trabalho de Prevenção Posithivo são ainda mais relevantes por serem idealizadas e geridas por pessoas que vivem com HIV. As noções de promoção de cidadania para quem é atendido pela ONG é pensada por pessoas que são seus pares.
Além das pessoas soropositivas, a atuação do GTP+ acolhe a população transsexual e as profissionais do sexo, como também outros grupos em situação de vulnerabilidade social.
Foi no GTP+ que pessoas como Maria Clara de Sena, mulher trans e ativista dos Direitos Humanos que hoje vive exilada no Canadá, teve conhecimento de seus direitos e de sua cidadania.
Através do projeto Mercadores de Ilusão, a então profissional do sexo passou a conhecer mais o trabalho da ONG, retomou os estudos e se tornou a primeira transsexual do mundo a assumir um cargo em um Mecanismo de Prevenção à Tortura, órgão parceiro da ONU.
Desde 2017, Maria Clara vive no Canadá, devido às perseguições relacionadas ao seu trabalho nos presídios de Pernambuco.