Mãe e filho compartilham a jornada e os desafios de se entender trans na adolescência
Para Laura Ribeiro da Silva, ser mãe de um adolescente trans é lutar diariamente pelo seu bem-estar pessoal e apoiá-lo em suas demandas relacionadas à transgeneridade, sempre visando ao seu desenvolvimento como cidadão consciente e responsável. Moradora de Vitória, ela acredita que a educação é o único caminho para a transformação da sociedade.
“A adolescência é uma fase complexa na vida de todes, pois é palco para grandes mudanças físicas, hormonais e emocionais. Ser mãe de um adolescente trans é lutar diariamente pelo seu bem-estar pessoal como adolescente e apoiá-lo em suas demandas relacionadas à transgeneridade, sempre com vistas ao seu desenvolvimento como cidadão consciente e responsável”, afirma Laura Ribeiro da Silva (46), mãe de Thales (13) e Olívia (11).
Moradora de Vitória, ES, ela atua como professora universitária há mais de 30 anos e acredita que a educação é o único caminho para a transformação da sociedade.
Como foi apoiar a transição do seu filho?
Aos 11 anos, Thales contou à mãe sobre sua transgeneridade. Ela sabia que ele estava falando a verdade, pois ninguém melhor do que ele para responder por sua própria identidade. Como retorno, Laura ofereceu ajuda no que ele precisasse.
“Ele sempre teve questões psicológicas na infância, relacionadas à insegurança e à timidez excessivas, que foram levadas para terapias com psicólogas em diferentes momentos, mas que não pareciam efetivamente resolvidas. Quando ele se revelou trans, percebemos que talvez a identidade de gênero fosse uma questão no cerne das dificuldades da infância e que, agora, poderíamos abordar de outra forma”.
Desafios enfrentados pela família
Laura relata que sua relação com a família é ótima e estão cada vez mais próximos, mas os desafios, segundo ela, estão ligados à assistência à saúde, pois o Brasil tem somente quatro ambulatórios especializados em população trans infantojuvenil.
Outro desafio é educar a sociedade sobre a transgeneridade, com vistas à promoção de ambientes acolhedores para “nosses filhes”, agora e no futuro, para que se sintam pertencentes. Ouvir a criança trans é essencial para aprender sobre ela. A partir daí, todo aprendizado será significativo na construção do relacionamento familiar. Também é importante saber que existem redes de apoio, ONGs onde os pais podem encontrar esclarecimentos, apoio e troca de experiência com quem está passando por uma situação semelhante.
“Hoje meu filho se orgulha de ser quem é, se tornou uma pessoa vaidosa, feliz com a sua imagem e as suas escolhas. É popular na escola e tem muitos amigos e se relaciona facilmente com as pessoas”.
O pai de Thales
Para Glauber, não foi fácil quando Thales contou ser transgênero. Expectativas, planos… Tudo pareceu se desfazer. Além disso, ele conta que depois veio a sensação do luto por pensar ter perdido uma filha. Mas o pior mesmo era o medo do preconceito que Thales sofreria ao longo da vida.
“Não sabíamos que direção tomar, mas focamos no amor que sentimos por nosso filho. É uma criança que, mais do que nunca, precisa da nossa ajuda para enfrentar um mundo que não vai facilitar nada para ele. Pesquisamos, nos informamos e buscamos ajuda de quem já tinha passado por algo parecido e, com o passar do tempo, nos surpreendemos com a criança maravilhosa e livre que desabrochou.”
Glauber deixa uma mensagem para outros pais, que estão passando pelo mesmo processo e pede que pensem sempre no amor que sente por seu filho ou sua filha.
“Não importa a sua identidade de gênero ou a orientação sexual que ele siga, ainda é pessoa que você sempre amou. Não solte a mão dele/dela na hora que mais precisa de você. Se esse processo de transição já é difícil para adultos, imagine para uma criança!”
Entrevista com Thales
Neuza: O que significa ser uma pessoa trans para você? Como você lida com o preconceito?
Thales: É tranquilo, mas tem gente sem noção. Não ligo muito. Tem um cara da escola que é transfóbico, mas ele só fala mal de mim na minha ausência e, por isso, não o denuncio. Mas sou grosso com ele. Dizem que ele fala coisas como “sabia que A THALES tem vagina?” É deplorável a falta de informação do coitado.
Neuza: Em qual momento ou idade você se entendeu trans?
Thales: Desde pequeno, por volta dos quatro ou cinco anos, já não me sentia confortável. Aos nove anos, eu pensava que eu era lésbica.
Neuza: Como se sente em relação ao seu corpo hoje?
Thales: Não curto ele, mas é só colocar roupa e tudo bem, meus peitos não aparecem tanto por causa do bloqueio hormonal… Então, fico de boa!
Neuza: Qual mensagem você gostaria de passar para outros adolescentes trans?
Thales: Recomendo fazer terapia com psicólogo especializado na comunidade LBGTQIA+; peçam ajuda aos seus pais ou responsáveis se sofrerem bullying na escola e, em caso de abuso, denuncie.
Identidade Social
Para os menores de 18 anos, a retificação de registro civil é feita por via judicial, em audiência com juiz. De posse da sentença do juiz, leve-a ao cartório de registro civil onde a criança foi registrada, e será emitida gratuitamente uma nova certidão e a certidão de inteiro teor.
Para informações, acesse Aliança Nacional LGBT
Para acompanhar essa história, siga Laura Silveirano Instagram
Saiba como denunciar a LGBTfobia
O canal oficial para denunciar esse tipo de crime no Brasil é o Disque 100, ou Disque Direitos Humanos – que fica sob responsabilidade da Secretaria de Direitos Humanos. A ligação é gratuita e funciona 24h, 7 dias por semana.
Nota aos leitores
Cisgênero: É o indivíduo que se apresenta ao mundo e se identifica com o seu gênero biológico. Exemplo: o gênero feminino costuma ser associado às fêmeas (sexo biológico).
Transgênero: Grupo que engloba todas as identidades e as expressões de gênero que fogem ao padrão de associação existente entre determinados aspectos corporais da pessoa e da sua identidade de gênero (masculina ou feminina).
Transexualidade: É a característica de quem se identifica através da nominação, vestimenta e/ou transformações corporais como pertencente a um gênero diferente do que lhe foi atribuído ao nascimento.
Nome social: Nome pelo qual as travestis e as pessoas transexuais se identificam e preferem ser identificadas, já que seu registro civil não é adequado à identidade e à expressão de gênero que elas possuem.
LGBTQIA+: A sigla LGBTQIA+ faz referência a lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queer, intersexuais, assexuais e demais orientações sexuais e identidades de gênero.