Aluísio Black: conheça o compositor e referência do Hip-hop em Goiás

Na cena e nas lutas sociais há mais de 30 anos, Aluísio Black une o Hip-hop, a educação e ações para mudar a situação de adolescentes e jovens negras e negros na região centro-oeste do país

20.10.21

Crédito: Divulgação

Por: Gabriel Murga / Lupa do Bem – Favela em Pauta

“A pandemia trouxe um retrocesso em toda a sociedade, e a gente tem lutado. Estávamos lutando antes da pandemia, estamos lutando durante, e no pós-pandemia não vamos parar. A luta é eterna. Como sempre disseram meus mestres, ‘casa que falta pão, todo mundo briga e ninguém tem razão’. Nós temos mais de 30 anos de estrada. Sou da velha guarda da cultura hip-hop de Goiás, que hoje usa a metodologia das artes urbanas, da cultura hip-hop como educação e reinserção social, e tem colaborado muito aqui”,  afirma o Rapper e MC, Aluísio Black, que tem quatro CDs gravados ao longo da carreira e atualmente é presidente do CENEG-GO e do Centro de Referência da Juventude no estado de Goiás

Ele continua: “nós somos um grupo de pessoas ligadas ao hip-hop, ao movimento negro que saiu do discurso e veio para a prática. O discurso sem ação é morto. Então, nós pegamos aquilo que a gente fala nas letras de rap, nas expressões do grafite, do break e do DJ e trouxemos para prática. E fazemos cidadania”.

“Trazemos para cá a molecada, os jovens e as famílias. Por meio das atividades socioeducativas, nós estamos conseguindo falar de valores, de princípios, de educação, de sociologia. Todo o processo, uma cadeia que a cultura hip-hop e o mundo da rua traz, de suma importância para lidar com essa ‘chamada delinquência’ que está nas comunidades, que está nas periferias, e que atinge toda juventude, em especial o jovem negro”, relata.

Aluísio Black

Lupa do Bem: Como o hip-hop e o rap, especificamente, podem contribuir para a educação de jovens e adolescentes?

Nós, como um ponto da cultura Hip-hop do estado de Goiás, o único ponto inscrito nos órgãos governamentais há mais de 10 anos como um ponto exclusivo que não parou os trabalhos. 

Nós temos inúmeros grupos de jovens lançados por nós. Temos nosso estúdio de gravação, nossa própria rádio, nosso próprio salão. Temos uma produtora completa que colabora com o artista, não só com a parte artística que é importante, mas, colaboramos na área da cidadania, da assistência social que também desenvolvemos. 

Muitos dos nossos conseguiram ir para faculdade e lá se formaram como gestores, como assistentes sociais, advogados, psicólogos que trouxeram essa devolutiva para comunidade e têm abraçado conosco, ‘ombreado’ aqui, essa missão do ponto da cultura hip-hop e desenvolvido, transformado vidas, de uma forma simples e singela que a cultura hip-hop apresenta.

Lupa do Bem: Como o CRJ-GO contribui para ações de prevenção a violência contra as mulheres? E as ações orientadas contra o racismo?

O CRJ-GO depois de muita luta – e continuamos lutando – se tornou uma voz ativa nos órgãos de controle sociais da periferia ao controle de políticas públicas, a formulação de políticas públicas. Então, a entidade tem vaga no Conselho da Mulher, é titular do Conselho de Estado de Segurança Alimentar e Nutricional, do Conselho da Igualdade Racial, do Conselho de Direitos Humanos e Combate ao Preconceito, e do Conselho da Juventude.

Há tempos nós ocupamos essas cadeiras e levamos a experiência para ser transformada em políticas públicas as ações que nós aprendemos na quebrada, na comunidade, levando para essas instâncias e ao poder público que eles também têm a ganhar com isso. 

Porque a sociedade civil organizada, acreditamos, vai gestar as políticas públicas do planeta. Países em desenvolvimento já perceberam isso, e o Brasil também não tem outra direção a não ser acatar as organizações da sociedade civil organizada para sugerir e colaborar com as políticas públicas. 

O CRJ, então, tem esses projetos e programas de combate e prevenção à violência contra mulheres.

Aluísio Black

 

Os debates feitos por nós, os seminários, as rodas de conversas, os shows e os encontros são realizados constantemente. Desenvolvemos na nossa comunidade, na nossa sede social, atividades antes da pandemia, e vamos continuar com essa linha de raciocínio e pensamento, de sempre colaborar para amenizar a violência contra mulher, a violência contra a juventude das periferias, em especial a juventude negra. E, continuar sempre no combate ao racismo. O racismo é um câncer, e precisamos combatê-lo a todo momento, porque é uma situação que destrói sonhos. As comunidades negras, a CENEG-GO, por ser o centro de cidadania negra do estado, é a única instituição que abriga essas comunidades na capital de Goiás, sendo o único ponto de apoio que as comunidades têm na capital quando vem em busca de justiça social ou quando vem em busca de tratamento de saúde e outras demandas.

Hip-hop

É em nossa instituição que essas comunidades são acolhidas. Comunidades quilombolas, povos de terreiros, indígenas, congada, hip-hop, capoeira. Então, é na nossa instituição que acolhe essa comunidade. É bom falar sobre isso. Nós nascemos para essa missão, e nós não surgimos e depois abraçamos a missão: trabalhar com as comunidades negras e povos tradicionais, a juventude negra e periférica, e a missão é essa. 

Estatutariamente falando e estamos aqui na linha de frente. Somos um exército de pessoas, voluntários e diretores, que nos encorajam a estar sempre ativos, buscando saídas para as constantes problemáticas que existem na sociedade. E, esses enfrentamentos aí também por parte do governo, das políticas públicas que está dando uma atrasada do governo federal, mas nós estamos conseguindo romper. É aquilo que eu falo, a luta sempre continua.

Lupa do Bem: Quais realizações você destacaria para as pessoas de outras periferias do país?

Pela experiência própria que todas as periferias, todas as organizações juvenis ou não, mas da sociedade civil periférica e favelada, precisa, no primeiro momento, se primar pela organização. 

Nós somos cidadãos de papel. Se você quer se relacionar com a sociedade, com o poder público, além de ter uma gestão transparente e conseguir estabelecer essa parceria, na própria comunidade também com poder público, você precisa ter os princípios da legalidade do ponto de vista institucional. 

Nós escolhemos esse caminho para poder ter o número de parceiros que temos: do Judiciário, do poder público e da sociedade civil, de empresários e colaboradores.

Aluísio Black

Lupa do Bem: Qual a origem e como você iniciou?

Esse trabalho se deu há 30 anos, e como já te disse, eu sou da velha guarda. Então, tudo aquilo que eu colocava em minhas letras e que eu ouvia dos meus ídolos, como Thaíde e DJ Hum, e depois Racionais Mc, atribuo à minha formação e aos grupos locais aqui da mesma época, Cães de Rua e Selvagens eletrorock, porque no mesmo ano de 1980, esses grupos já se encontravam nas periferias do Brasil. 

Então, essa estrada é longa, trouxemos para prática aquilo que nós expressamos nas letras de rap, o que nós expressamos das expressões da Arte, da cultura hip-hop e afro-brasileira. E essas expressões potencializaram quando trouxemos elas para a prática. As origens se deram nas formações por meio da música e da arte, e depois ela foi-se ampliando para assistência social, e vai se ampliando para área habitacional, profissional, e para as áreas dos direitos humanos. 

Aí, você vai compreendendo toda essa cadeia aí que pode somar muito com nosso povo das comunidades. E felizes, porque temos o conhecimento, temos a consciência de que o hip-hop tem feito e ainda tem muito para se fazer. 

Eu atribuo, sim, à cultura hip-hop para chegarmos onde estamos e ainda é só o começo. Agora somos uma das instituições em Goiás, fundadora da Federação Goiana de Breaking, porque nos tornamos um esporte olímpico. 

Aluísio Black

Como eu disse que nós estamos inseridos nessa temática, nós estamos agora fundando a Federação de Break do Estado de Goiás, pretendendo colaborar muito com a juventude periférica, e tendo todo o cuidado para que a cultura hip-hop não seja, ou não se torne um modismo, ou se restrinja a um produto de mercado, mas se consolide a cada dia como uma cultura sociocultural em defesa dos princípios morais éticos e de transformação social.

 

    Centro de Referência da Juventude (CRJ)
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Autor: Redação - Lupa do Bem
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