As borboletas brancas que patrulham os céus da Colômbia

Profissionais de saúde voluntários viajam para as áreas mais remotas do país para fornecer diagnóstico e tratamento especializados

04.07.24

Por Sergio Hernández Perea

Nas regiões mais isoladas da Colômbia, escassez de cuidados com a saúde visual, testes diagnósticos, exames especializados, cirurgias, saúde reprodutiva, entre outros, são comuns. As pessoas destas comunidades não estão acostumadas a ver um profissional de saúde e, em muitos casos, não têm conhecimento de que possuem alguma doença. 

Além disso, em territórios marginalizados, é difícil acessar centros médicos. Em algumas áreas, são necessários meios de transporte incomuns, como barcos ou outros veículos marítimos, para alcançar o ponto de atendimento primário. Essa situação tem sido exacerbada pela migração em massa de populações vizinhas da Venezuela, que chegam em condições de saúde precárias, com novos patógenos e sem acesso ideal a qualquer tratamento. 

Aqui entra a Patrulla Aérea Civil Colombiana (PAC) (‘Patrulha Aérea Civil Colombiana’), uma organização sem fins lucrativos que, nos últimos 58 anos, tem se dedicado a realizar missões médicas para esses lugares, onde até mesmo o analgésico mais comum é um tesouro.

A PAC foi criada para apoiar as autoridades em operações de resgate em áreas de difícil acesso. Surgiu da união de pilotos amadores que queriam utilizar suas aeronaves e conhecimentos para o bem comum. Rapidamente, as necessidades médicas das populações mais vulneráveis tornaram-se evidentes para essa associação de pilotos, que têm sistematizado suas missões.

Chaves para uma operação humanitária bem-sucedida

Com uma média de 20 missões por ano, que envolvem o transporte de pessoal qualificado, suprimentos, medicamentos e tecnologia sensível, a chave para a PAC é o foco e a organização. 

“Não realizamos apenas brigadas médicas e cirúrgicas planejadas, mas também respondemos às maiores emergências do país, como a avalanche em Armero ou o terremoto no Eixo Cafeeiro”, diz Pamela Estrada, diretora geral da Patrulla. Focar em missões que promovam a saúde é, segundo ela, a maneira como a organização dá o seu melhor. 

Tudo isso requer coordenação meticulosa, já que uma equipe multidisciplinar de voluntários deve ser reunida, disposta a dedicar um fim de semana inteiro para fornecer serviços, realizar as tarefas mais necessárias e equipá-las com os implementos apropriados. Além disso, os horários dos pilotos, que são a espinha dorsal da operação, devem ser gerenciados, pois não apenas doam seu tempo, mas também disponibilizam suas aeronaves para transportar profissionais de saúde. 

Para funcionar, apenas em 2023, a Patrulla recebeu doações de mais de 3,725 bilhões de pesos colombianos (USD 894,779.56 e R$ 4.470.000,00) e a gestão bem-sucedida dos recursos resultou em 19,370 intervenções, divididas em 13,499 consultas médicas, 446 cirurgias, 1,812 suportes cirúrgicos e 3,613 procedimentos não cirúrgicos. Adicionalmente, foram fornecidos 7,670 tratamentos médicos, 4,655 óculos de prescrição e 903 implantes de planejamento familiar. Esta operação envolveu 272 voluntários, sendo 242 profissionais de saúde e 30 pilotos, que doaram seu tempo e expertise.

O que não pode ser mensurado

“Outras iniciativas de saúde que conheço não fornecem óculos aos pacientes; a Patrulla faz isso. Sinto que isso faz toda a diferença para os pacientes”, disse Daniel Santos, optometrista.

No departamento de Vaupés, beneficiários da missão contam que nunca tinham consultado um médico antes.

Este é um cenário comum nos territórios onde a Patrulla chega com suas missões médicas. Mulheres que tiveram múltiplas gestações e nunca receberam cuidados pré-natais, pessoas que não têm consciência de condições visuais e descobrem isso através das missões, ou casos de desnutrição e desidratação em terras férteis e abundantes.

“Como isso é possível?”, diz indignada a ginecologista Angela Vargas, que contribui com seu conhecimento para a Patrulla há 7 anos. Durante esse tempo, ela viu de tudo e lamenta que a precariedade dos territórios remotos faça da saúde a última preocupação dos habitantes. Para Dra. Vargas, esses 7 anos foram um duro despertar para a realidade da sociedade colombiana, mas também um tesouro inestimável para sua profissão. “Você aprende a ser médica aqui. Sou ginecologista graças às missões da Patrulla. Na cidade, é fácil tratar os pacientes; tenho tudo à minha disposição, os pacientes me entendem e tudo é mecânico. Nas missões, superando limitações e atendendo pessoas que transbordam gratidão com o menor tratamento, é onde me tornei médica”, diz.

Viviana Castaño, uma pediatra de 33 anos que decidiu retornar para sua segunda missão, relata que interagir com as crianças das regiões foi terapêutico para ela. “Não é apenas a dor, é o dia-a-dia”, diz a médica, enfatizando que além das necessidades físicas, o espírito dos pacientes também deve ser considerado. “Nós pediatras somos os médicos de toda a família; tratamos a criança, mas ouvimos a mãe, aconselhamos a avó… e percebemos que as crianças têm esperança”.

Cristian Machado, um menino venezuelano de 10 anos, beneficiário de uma das missões da Patrulla no departamento de Arauca, leste da Colômbia, e potencial advogado, é um exemplo dessa esperança. De senti-la e inspirá-la: “Acho que, se você tem três pirulitos e dois amigos, o melhor é um para você, um para você, e um para mim”.

A cada duas semanas, às 6 da manhã, quando os voluntários se preparam para decolar no norte da capital colombiana, não é apenas um grupo de pessoas com suprimentos médicos que decola. As borboletas brancas que anunciam esperança decolam. Decola um hospital móvel que capacita melhores profissionais de saúde para uma nação que ainda sofre.

Embora essas ações possam parecer paliativas para uma doença crônica, os envolvidos garantem que uma única criança diagnosticada, um par de óculos entregue, ou uma mãe acompanhada, valem a pena.

Saiba mais sobre essa ONG em www.patrullaaerea.org.

Autor: lupadobem
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