Brasil desponta como país com diversidade de nacionalidades de imigrantes e refugiados

Organizações do terceiro setor são centrais para inclusão e promovem acolhida, capacitação e interiorização de imigrantes e refugiados no país

08.11.23

O Brasil recebe cerca de 400 imigrantes e refugiados vindos da Venezuela diariamente. Por aqui também chegam muitas pessoas de Cuba, Angola, Nigéria, Afeganistão, Peru, Líbano e uma centena de outros países em busca de novas oportunidades de vida. Segundo relatório do Observatório das Migrações Internacionais, em 2022, nativos de 139 países solicitaram refúgio ao Brasil, tornando o país uma das nações com maior diversidade de nacionalidade de imigrantes e refugiados no mundo. 

Entre as principais causas que levam ao deslocamento forçado estão a guerra civil, perseguição política, violência e violação de direitos humanos. Os problemas, no entanto, não acabam com a imigração e a solicitação de refúgio. Pelo contrário, barreiras ligadas à linguagem e às diferenças culturais dificultam a inclusão no país.

Segundo Carolina Nunes, gerente de operação e novos negócios da organização Refúgio 343, que promove a reinserção socioeconômica de refugiados e migrantes no Brasil, o preconceito contra estrangeiros, ou seja, a xenofobia, ainda é o maior desafio para a boa adaptação dessa população. 

“Existe uma percepção equivocada sobre os refugiados e imigrantes, que leva justamente a uma falta de compreensão dos motivos pelos quais essas pessoas estão deixando seus países. Os migrantes não competem contra os residentes e tendem a complementar a força de trabalho preexistente, trazendo benefício econômico para toda a sociedade”, explica.

Acolhimento

Criado em 2019, o Refúgio 343 iniciou suas operações de maneira informal, no auge da crise generalizada enfrentada pela Venezuela. “Estavam chegando 1.500 venezuelanos por dia no Brasil e o Fernando Rangel, que depois veio a fundar a organização, se mobilizou para apoiar algumas famílias”, conta Carolina Nunes. 

Ele começou oferecendo acolhimento como pessoa física e junto com vários amigos, fez uma vaquinha e alugou um imóvel, de número 343, em São Paulo. A primeira família acolhida tinha quatro pessoas. Os amigos se dividiram para ajudar: um fez o currículo, o outro apoiou na inserção profissional, um terceiro arrecadou móveis, o outro matriculou as crianças na escola. 

Logo essa família ganhou autonomia e em pouco tempo, conseguiram acolher a segunda, depois a terceira… quando tinham acolhido dez famílias, perceberam que era hora de montar uma ONG. Hoje, além de promover a interiorização dessa população e sua reinserção socioeconômica, o foco é a Escola Refúgio, que oferece cursos profissionalizantes, curso de língua portuguesa e educação intercultural. 

“Nós fazemos a ponte com empresas que querem contratar refugiados e migrantes. Apoiamos com elaboração de currículo e toda documentação necessária, depois encaminhamos para as melhores oportunidades e acompanhamos todo o processo seletivo, para que os deveres e direitos sejam cumpridos”, afirma Carolina. 

Imagem: reprodução.

Colocação profissional

O Refúgio 343 vem colaborando com a Operação Acolhida, programa coordenado pelo Governo Federal para receber venezuelanos em situação de refúgio em Boa Vista (RR). Desde então, já promoveu a interiorização de quase 4 mil pessoas, em mais de 236 cidades, de 20 estados mais o Distrito Federal.

A interiorização é feita em parceria com pessoas, organizações nacionais e internacionais e empresas, que auxiliam com os custos de transporte e acomodação inicial, a busca de emprego e moradia e a inclusão nos sistemas de saúde e educação brasileiros. Tamanha dedicação lhe rendeu o título de Melhor Ong do Brasil em 2022 e o prêmio de Empreendedor Social, da Folha. 

O Instituto Estou Refugiado é outra organização com forte atuação na empregabilidade. Criado em 2019, inseriu mais de duas mil pessoas imigrantes e refugiadas no mercado de trabalho a partir de uma relação institucional com um grupo de 200 empresas que oferecem vagas de inclusão. 

“Muitas empresas estão querendo contratar em função do ESG e ainda que hoje a questão racial prevaleça, também existe espaço para imigrantes e refugiados”, aponta Luciana Capobianco, fundadora e diretora executiva do Instituto Estou Refugiado. Ela também foi tocada pela causa durante uma crise humanitária. 

“Em 2015, com a guerra da Síria, circularam muitas imagens de corpos flutuando no Mediterrâneo, pessoas que deixaram tudo para trás, sem perspectiva. E chegaram muitos sírios no Brasil. Ali pensei que poderia fazer algo, oferecer um recomeço para essas pessoas que estavam chegando sem falar a nossa língua, focar na inserção socioeconômica… não foi nada planejado”, lembra. 

Barreiras da língua 

Para Luciana Capobianco, fundadora e diretora executiva do Instituto Estou Refugiado, a barreira da língua é o principal fator que dificulta a colocação profissional. Ela ressalta que diferentes perfis de imigrantes e refugiados chegam ao Brasil:

“Chegam muitas pessoas sem formação acadêmica e também pessoas com ensino superior, como médicos, engenheiros, engenheiros de software, professores, etc. Mas independente da qualificação, as empresas preferem contratar quem fala português e leva um tempo para aprender a língua. Muitos ainda precisam fazer a revalidação do diploma. Então é uma jornada gigante”.

Segundo Luciana, às vezes isso faz com que o imigrante mude de ideia no meio do caminho e resolva ir para outro país. “Tem acontecido muito com a população afegã, que chega ao Brasil e logo muda a rota para os Estados Unidos, porque muitos já falam inglês e não precisam esperar dois anos para aprender o português e refazer a vida”, afirma.

Imagem: reprodução.

Deslocamento forçado 

Além de promover a inserção no mercado de trabalho, as organizações do terceiro setor possuem uma atuação relevante ao chamar atenção para a causa. “É preciso dar voz e protagonismo para as pessoas que estão chegando, ver o que elas estão falando e colocá-las em foco”, defende a fundadora da Estou Refugiado. 

Luciana é jornalista e começou o ativismo fazendo uma comunicação de causa, por meio da produção de conteúdo e storytelling. Um projeto emblemático foi um experimento social  na plataforma Tinder: 

“Primeiro criamos o perfil de um engenheiro estrangeiro que falava cinco línguas e ele recebeu 30 pedidos de encontro. Uma semana depois, alteramos o perfil e mudamos a palavra estrangeiro por refugiado. Foram apenas 3 pedidos. O experimento era para promover uma reflexão sobre preconceito e intolerância”, conta. 

Ela também coordenou, em parceria com a ONG Humans Right Watch, a criação de um totem interativo sobre uma família síria que fugiu da guerra e teve que cruzar dezenas de fronteiras até chegar à Suécia. O totem permitia que as pessoas vissem a história de um refugiado e foi disponibilizado para o público em uma exposição fotográfica.

“Era um vídeo curto, muito emocionante e no final, quando parecia que tinha acabado, o totem imprimia um currículo. Fizemos uma provocação para disseminar aquela mensagem, levar a necessidade do trabalho adiante, o público também poderia ser um agente de impacto”, reflete. 

Preconceito e intolerância

Pelo menos 108 milhões de pessoas em todo o mundo foram forçadas a deixar suas casas no último ano, ou seja, mais de 1 em cada 74 pessoas, conforme o relatório mais recente do ACNUR , a agência da ONU para Refugiados. Assim, preocupados com a xenofobia, o Refúgio 343 também promove campanhas de conscientização por meio de mensagens que promovam a empatia e a compreensão. 

O objetivo é construir pontes de comunicação e redes de apoio que promovam a solidariedade entre pessoas refugiadas e imigrantes e a comunidade local. Os venezuelanos e jogadores de futebol Yeferson Soteldo e Tomás Rincón, que hoje jogam pelo Santos, são dois embaixadores que participam dessa campanha no Refúgio 343. 

“Eles ajudam a disseminar a causa e apoiam o nosso trabalho de conscientização da sociedade com o seu próprio exemplo. Por que são exemplos de sucesso, de pessoas que vieram por conta própria e que contribuem com nosso país”, diz Carolina Nunes, gerente de operação do Refúgio 343. 

Carolina alerta que as mudanças climáticas devem aprofundar o deslocamento forçado na próxima década. Por isso, a causa da imigração e refúgio deve ser popularizada e defendida cada vez mais. “Todos nós somos seres humanos e em algum momento podemos vir a precisar de apoio de outra nação para seguir em frente, porque não sabemos o destino do nosso país, não sabemos o que pode vir acontecer amanhã ou depois”, defende.

Quer apoiar essa causa?

Todas as organizações citadas nesta reportagem desenvolvem suas ações por meio de doações e voluntariado. Para mais informações, visite o site, siga as redes sociais ou entre em contato por e-mail:

Refúgio 343

Site: https://refugio343.org/

Linkedin: https://www.linkedin.com/company/refugio343/mycompany/

Facebook: https://www.facebook.com/Refugio343

Instagram: https://instagram.com/refugio343_

E-mail: info@refugio343.org

Estou Refugiado

Site: https://estourefugiado.org.br/

Linkedin:: https://www.linkedin.com/company/estourefugiado/

Facebook: https://www.facebook.com/estourefugiado

Instagram: https://www.instagram.com/estourefugiado/

E-mail: contato@estourefugiado.org.br

 

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Maira Carvalho
Jornalista e Antropóloga, Maíra é responsável pela reportagem e por escrever as matérias do Lupa do Bem.
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