Fortalecendo o hip hop e a identidade dos jovens de periferia
O projeto, nascido na periferia, vem valorizando e dando visibilidade às pessoas envolvidas na cena do Hip Hop com organização e resistência
Crédito: Pedro Leão
Por: Eduarda Nunes – Lupa do Bem / Favela em Pauta
Desde 2005 funciona, nas periferias da Região Metropolitana de Recife (PE), o projeto Jornada de MC’s, com circuito anual de batalhas de rima e atividades que contribuem para o crescimento dos envolvidos no cenário do hip hop, seja na dança, no grafite e a produção musical, a partir de oficinas e espaços de diálogos.
Quando o assunto é a cultura das favelas e periferias, falar sobre o hip hop é inevitável. É a partir do rap, do grafite, da música e das danças urbanas que muitas crianças descobrem potencialidades que chegam a se tornar uma ocupação profissional ou um refúgio pessoal.
As batalhas de rimas são como nascedouros e, percebendo a importância desses eventos, Anderson Oliveira dos Santos, também conhecido como Dj Big, criou o projeto Jornada de Mc’s, que desde 2005 propõe estrutura física e busca maior visibilidade e valorização dos jovens de periferia que mantém a cultura do hip hop viva.
Esse é um dos poucos projetos que estimulam uma troca de saberes entre as periferias na Região Metropolitana do Recife. Os jovens de diferentes comunidades e grupos de batalha de rima competem entre si, fortalecendo o cenário do hip hop local. “As batalhas são um espaço de diálogo social diretamente entre eles. Social-político, né? Porque eles estão sempre ali na discussão de se afirmar, de fazer um debate, de se valorizar e se cobrando por cada coisa, seja por uma questão da discriminação racial entre eles, da homofobia, enfim, todos esses debates que rolam acabam sendo políticos e sociais dentro das batalhas e favorecem o crescimento desses jovens”, conta o produtor e educador social Dj Big.
Entenda a estrutura do projeto
Além das batalhas de rima, o projeto também estimula o desenvolvimento dos artistas na dança, no grafite e na produção musical a partir de oficinas e espaços de diálogos. Quando o projeto ainda estava engatinhando e com a pretensão de abraçar primeiramente o Recife e a região metropolitana, o Jornada de Mc’s chamou a atenção de jovens de outras cidades do nordeste. A regularidade das edições ano após ano fez com que o evento também passasse a constar no calendário dos artistas da cena do hip hop não só em Pernambuco, mas também de outros estados do Nordeste.
Big conta que recebe mensagens durante todo o ano sobre a realização do evento, seja para receber material dos artistas que se interessam em tocar no evento ou para enviar certificados, registros de quem participou de alguma edição. O Jornada de Mc’s é considerado um projeto-vitrine do hip hop de Pernambuco e do Nordeste, afirma Anderson.
Mas para participar do Jornada de Mcs não é só chegar, é preciso ter entrosamento na cena do hip hop da sua comunidade. Só chegar e “botar o nome”, como conta o produtor e educador social, não vale. É preciso viver a sua própria periferia.
Essa competição é uma das mais expressivas no Brasil e, além de unir os artistas do hip hop, também faz o esforço de conectar esses artistas com a cultura popular. É esse o objetivo quando as etapas classificatórias do Jornada passam a acontecer enquanto parte da programação da Terça-Negra – evento de celebração da cultura negra promovida pelo Movimento Negro Unificado que acontece no Pátio de São Pedro, bairro de Santo Antônio, no Recife.
Ainda na perspectiva de ampliar os espaços para a cultura hip hop, desde 2018 a equipe do Jornada faz o esforço e todos os trâmites de inserir o projeto na programação de alguns eventos financiados pelo poder público que atraem grande público, mas que ainda mantém a periferia por fora. São eles: Rec’n’Play, um dos maiores festivais de tecnologia e economia criativa do Recife, e o Festival de Inverno de Garanhuns, que em 2022 realizou sua 30ª edição com recorde de público, sendo um dos maiores festivais multiculturais do Brasil e é realizado na região Agreste de Pernambuco.
O corre de fortalecer o Jornada de Mc’s é diário
Dj Big afirma que existe “certa dificuldade de mostrar o valor que a periferia tem”, e que fazer a Jornada de Mc’s acontecer desde 2005 até hoje diz muito sobre o compromisso e vontade da equipe, com uma média de cinco pessoas, que mantém a operacionalização do projeto.
Embora haja um reconhecimento do estado nas ações e formações que o Jornada promove, Big entende que não há uma prioridade do poder público na realização das edições. Todas elas acontecem por meio de editais de incentivo à cultura e arte em Pernambuco.
A pandemia causou um grande impacto na produção do Jornada de Mc’s, que também conta com o custeio dos próprios produtores para ter continuidade. A equipe que tem feito o projeto seguir de pé conta com Danilo Carias, Fernando Arruda, Okado do Canal, Gilblênio Saadh e Hulli Popping.
Em 2022, com o apoio da Lei Aldir Blanc Pernambuco, o Jornada de Mc’s realizou duas edições. A primeira aconteceu de forma descentralizada em quatro bairros do Recife no primeiro semestre do ano. Nela foi realizada a seletiva dos artistas que competiram na edição do Festival de Inverno de Garanhuns, em julho. A expectativa para o segundo semestre é a participação no festival Rec’n’Play.
Contribua para manter o projeto ativo!
Para ajudar a fazer esse projeto continuar acontecendo, acompanhe a página no instagram e entre em contato com os produtores. Esse ano o Jornada de Mc’s completa 17 anos fortalecendo a cena do hip hop do Recife, de Pernambuco e do Nordeste.