Amor inclusivo: casal homoafetivo adota criança com deficiência

Segundo o portal GABACON, em 2023, no Brasil existiam 4.078 crianças para adoção e 5.096 crianças em processo de adoção

21.02.24

No nosso país não há nenhuma distinção de idade, sexo ou estado civil para adotar uma criança ou adolescente. É uma característica da adoção no país. E você, já pensou em ser pai ou mãe de coração? 

Patrícia e Priscila, duas mulheres numa relação homoafetiva, lutaram pelo direito de serem mães adotivas e estão quase na etapa final do processo de adoção de Rafael, na época com 13 meses. Um menino que, ao nascer, recebeu diagnóstico de paralisia cerebral leve, o que não as impediu de amá-lo assim que o conheceram. 

Patrícia sempre sonhou ser mãe, mas por conta de uma menopausa precoce, se viu infértil aos 29 anos. Abaixo, durante uma entrevista à Coluna da Neuza, ela conta, emocionada, um pouco dessa história.

Coluna da Neuza: Como você superou o fato de não poder gerar um bebê?

Patrícia: “Primeiro, veio a não aceitação, depois ficava me perguntando, porque logo comigo, Deus? Eu não conseguia entender por que Ele me deu um coração tão cheio de amor por crianças, mas eu não podia ser mãe. 

Mais à frente, através da minha irmã, que é muito religiosa, descobri que podia ser mãe sim e, para isso, não precisava engravidar. Eu podia gerar um filho no coração, pois, para ser mãe, basta ter muito amor para dar a uma criança”.

Então, ela foi atrás da adoção. Patrícia diz que aconteceram vários empecilhos no caminho, mas lutou até conseguir se habilitar para o processo. Nessa mesma época, ela foi morar com Priscila, que, no decorrer do tempo, entrou como companheira no processo e faz questão de dizer que a companheira sempre a apoiou em todas as horas, tornando o sonho de Patrícia também o seu.

Coluna da Neuza: Como foi o primeiro contato de vocês com o Rafael? 

Patrícia: “Quando fomos conhecer nosso filho, ele não se mexia e tinha um laudo de paralisia cerebral não identificada, sentimos medo. Medo de tirar ele do abrigo e não conseguirmos arcar com as demandas que viriam em sua companhia e a princípio decidimos que não seria possível aquela adoção e voltamos para casa”. 

O quarto da criança já estava, e foi nele que Patrícia entrou e conversou com Deus, pedindo que enviasse uma família para aquela criança. Passadas duas semanas, ela descobre que, além delas, Rafael não tinha recebido visita de ninguém.

Patrícia e Priscila resolveram que iam dar continuidade ao processo de aproximação. Patrícia voltou ao abrigo e, pegando a criança, falou: “a partir de hoje, eu sou sua mãe aqui na terra”. 

Depois de 15 dias de aproximação com ele, que é o tempo exigido para que ambas as partes, adotante e adotado se adaptem, as duas o levaram para casa. 

Elas contam que desde esse dia ele começou a mudar e hoje ele é outra criança; engatinha, mexe, com as mãos e faz muitas outras coisas que não fazia antes.

Imagem: reprodução

Diagnóstico

Depois, descobriram, através de exames que Rafael escuta 100%, apesar de às vezes parecer o contrário. Patrícia explica que isso ocorre devido o cérebro dele ainda não entender muito os sons, porém, com o tempo e muito estímulos, ele conseguirá escutar normalmente. 

As demandas de Rafael são muito grandes, todos os dias ele frequenta a ONG Dona Meca, onde ele faz fisioterapia motora e respiratória, fonoaudiologia, música e  futuramente irá fazer hidroterapia, além de ser assistido também pela Rede Sarah.

As duas mães trabalham fora, em horários diferentes e se dividem para cuidar de Rafael. No entanto, atualmente, Patrícia e Priscila não conseguem imaginar a vida sem o pequeno. 

Crianças para adoção

Patrícia diz ainda que a maioria das crianças que estão para adoção são grupos de irmãos, crianças acima de 10 anos, adolescentes, crianças com algum tipo de deficiência física ou mental e outras. “As pessoas idealizam que dentro do abrigo vai encontrar um serzinho louro, com olhos azuis, totalmente saudável, mas essa não é a realidade”.

“Uma outra coisa é que as pessoas costumam reclamar do sistema, que ele é muito demorado e burocrático, mas se não fosse por essa demora e burocracia muitas crianças seriam devolvidas e sofreriam novamente e, infelizmente, essa prática acontece muito”, diz. 

Recado para quem deseja adotar

Para terminar, Patrícia diz que seria impossível adotar Rafael se Priscila não estivesse a seu lado. É possível adotar solo, mas com uma pessoa ao lado tudo se torna mais leve.

E ela deixa um recado para você que tem dúvidas quanto à adoção.

“Se você quiser ser mãe, não depende de um útero, mas sim de um coração pronto para amar. E se você que tem medo de encontrar sua criança e ela ter algum problema de saúde, quero te dizer que um laudo não é uma sentença final, e o amor cura, assim como curou a vida de Rafael, da Priscila e a minha. Hoje, somos uma família feliz.”

Para casais ou pessoas solteiras que têm o desejo de adotar ou avaliam essa possibilidade, um dos suportes é o grupo de apoio como a ANGAAD, do qual Patrícia é voluntária. 

A única exigência para qualquer pessoa que deseja se habilitar para adoção é já ter 18 anos completos.

Para fechar, elas agradecem a existência de instituições que oferecem suporte a pessoas com necessidades especiais, como a Dona Meca e Rede Sarah. Elas dão chances e possibilitam que crianças como Rafael possam progredir, ter uma melhor qualidade de vida e, no futuro, poder exercer todo o seu potencial.

Siga Patrícia e Priscila, mães do Rafael no Instagram.

Neuza Nascimento
Após ser empregada doméstica por mais de 40 anos, Neuza fundou e dirigiu a ONG CIACAC durante 15 anos. Hoje é estudante de Jornalismo e trabalha com escrita criativa, pesquisa de campo e transcrições. No Lupa do Bem, é responsável por trazer reflexões e histórias de organizações de diferentes partes do Brasil para a "Coluna da Neuza".
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