Subúrbio do Rio guarda espaço com arquitetura singular
Museu da Humanidade abriga Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro (IPHARJ), e conta com mais de 100 mil peças obtidas em escavações e leilões
Por: Gabriel Murga / Favela em Pauta – Lupa do Bem
Em uma construção com ares de castelo islâmico e detalhes de arquitetura mameluca, localizada no bairro de Anchieta, na zona norte do Rio de Janeiro, o Museu da Humanidade abriga uma coleção com mais de 90 mil peças arqueológicas e históricas de diversas partes do mundo.
Além disso, esculturas e peças que simulam fósseis e máscaras mortuárias também podem ser encontradas e admiradas, inclusive por alunos de escolas da rede pública de ensino, localizadas perto do Museu.
O espaço abriga ainda o Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro (IPHARJ). O responsável e curador do museu é o arqueólogo Claudio Prado de Mello, que construiu o espaço com suas mãos há mais de 32 anos.
Fundado em 1990, o IPHARJ é uma organização não governamental e sem fins lucrativos, que visa promover a pesquisa, exploração e difusão da arqueologia mundial, história e ciência no Brasil e no exterior. Desde a sua fundação, o espaço promove um bem-sucedido trabalho de divulgação, e publica os resultados das suas recentes pesquisas científicas.
O acervo do espaço conta com milhares de peças já catalogadas – no entanto, Cláudio comentou, em entrevista à Lupa do Bem, que ainda busca “recursos para finalizar o trabalho”. “Esperamos em breve poder contar com a ajuda de estagiários e voluntários para dar prosseguimento a esse trabalho monumental”, declara.
Museu da Humanidade e o IPHARJ
O edifício do Instituto de Pesquisas Históricas e Arqueológicas cobre mais de 25.027 pés quadrados (cerca de 2.500 metros quadrados) e é uma homenagem à antiga arquitetura mameluca – um estilo em uso entre 1250 e 1517 no Oriente Próximo.
O espaço atende amplamente ao público que vem de várias partes da cidade, de outros estados, além de receber visitantes de outros países. Além disso, o lugar é reconhecido pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram).
O museu está dividido em quatro partes:
- O Memorial da Humanidade é uma parte especial do edifício, onde se encontra uma bela coleção de obras de arte e antiguidades que será disposta em 27 salas e em um complexo subterrâneo de galerias, nas quais a coleção de arqueologia funerária estará exposta
- Quatro salas para exposições temporárias onde funciona continuamente um vibrante centro cultural;
- Três laboratórios de Arqueologia e sete Reservas Técnicas de Objetos Arqueológicos;
- Além da Biblioteca de Humanidades, dedicada ao Sultão Qansuh Al-Ghuri, o Museu possui cerca de 70 mil títulos e resume o Centro de Documentação com cerca de 15 mil documentos e fotografias originais. No terceiro piso, o IPHARJ tem uma área semi-aberta, incluindo um jardim árabe, fontes de mármore e um teatro ao ar livre.
Localizado na rua Chrisóstomos Pimentel, nº 443, o espaço recebe visitantes no período de segunda a sexta, das 10h às 17h. Os ingressos custam 10 reais e o valor obtido com as entradas é revertido para a manutenção do Museu e para o pagamento dos funcionários, que são moradores da região. Além disso, há visitas gratuitas que podem ser agendadas no espaço.
O bairro de Anchieta está afastado dos tradicionais espaços onde se concentram o fluxo de visitantes de museus e espaços culturais na cidade do Rio de Janeiro. O local possui ainda outros espaços com essa finalidade, como a Lona Cultural de Anchieta e o Núcleo de Arte Grande Otelo.
O Lupa do Bem conversou com o responsável e criador do Museu da Humanidade, Cláudio Prado de Mello, sobre a história do espaço, as origens de sua família e a importância da arqueologia para a preservação do patrimônio e para a educação dos jovens.
Confira a entrevista:
Lupa: Como surgiu a iniciativa de construir esse espaço?
Cláudio Prado de Mello: a ideia de construir o IPHARJ é muito antiga, e nasceu da necessidade de ter espaço para acomodar uma reunião de livros e de objetos que a cada dia crescia. Tudo nasceu com uma coleção de peças romanas e gregas trazidas pela minha família materna quando veio de Milão, Itália, em 1825, atraídas pela ideia de que existia uma nova Corte Europeia no Novo Mundo. A Itália vivia conflitos territoriais e a vinda para o Brasil soou como uma oportunidade de vida nova.
Com eles, trouxeram peças pequenas, como se fossem parte de sua terra. Cresci fascinado por essas peças na casa de minha avó. Dessa forma, o gosto pelas coisas do passado sempre existiu, e com 11 anos eu já era um colecionador.
Com o tempo, amigos e pessoas começaram a colaborar e fazer doações. Hoje, o IPHARJ tem um acervo de mais de 100 mil peças, reunindo remanescentes de culturas de todo o mundo. Nossa biblioteca reúne mais de 70 mil títulos e abrange a [área das] ciências humanas, apesar de se concentrar nos temas da Arqueologia Mundial e do Patrimônio Cultural.
Lupa: a arqueologia ainda é vista como algo muito distante da vida cotidiana. Como aproximar as pessoas, especialmente os mais jovens de espaços como o Museu da Humanidade?
Cláudio Prado de Mello: a arqueologia sempre fascinou as pessoas de uma forma geral. No IPHARJ, temos uma experiência muito rica de receber e ouvir as pessoas com interesse nesses temas. Para aqueles que não tem interessante, mas tem sensibilidade para ouvir, nós criamos uma metodologia de trabalho que chamamos “sensibilização pelo patrimônio”, que é bem mais do que “educação patrimonial”, porque despertamos sentimentos, lembranças e conduzir as pessoas para os caminhos do respeito pelos nossos antepassados e, consequentemente, pelo cultivo da memória.
Consideramos que, quando trabalhamos com crianças e adolescentes, temos a oportunidade de abrir uma nova “janela” para mostrar um pouco do mundo do belo, do excepcional, do rico. Em outras palavras, trabalhando com o patrimônio e o conceito de memória, podemos mostrar um pouco desse passado tão importante e constitui o legado que nossos ancestrais deixaram para todos nós.
Lupa: qual a importância deste espaço para o bairro e para a zona norte da cidade do Rio? E da parceria com os espaços públicos de ensino?
Cláudio Prado de Mello: acreditamos que a cada movimento que fazemos, podemos influenciar o nosso entorno. O IPHARJ está no seu novo endereço desde 2002. Portanto, são 20 anos. O espaço foi fundado em 1990 e já completou 32 anos de existência em janeiro. Antes, [a organização] ocupava outro endereço, há cerca de 600 metros do prédio atual.
Nesse endereço, estamos com as portas abertas desde dezembro de 2009 e já recebemos um número ilimitado de grupos, tanto de colégios, universidades, grupos de terceira idade, de ‘socialites’, de pessoas de comunidades, de todas as idades, classes, credos e origens.
O foco é mostrar o quão importante é a mensagem do passado e a importância de nossa geração cuidar e preservar o patrimônio deixado pelos antigos. Conseguimos muitos avanços nesse sentido, pois não somente recebemos grupos na nossa sede, mas levamos a palavra da preservação do patrimônio a outros municípios e até outros estados. Esse é um trabalho que encaramos como uma verdadeira missão.
De alguns anos para cá, estabelecemos uma parceria com o Núcleo de Arte Grande Otelo, que faz parte da 6ª CRE da Prefeitura do Rio de Janeiro. O trabalho tem sido produtivo e o IPHARJ virou uma extensão do núcleo, onde as crianças podem expor o que elas produzem em um ambiente que favorece essa apresentação. Dessa forma, somamos anos de uma feliz e gratificante parceria que a expressão que mais definiria é “superar desafios”.
Lupa: quais materiais arqueológicos os visitantes podem encontrar no Museu?
Cláudio Mello: o IPHARJ ainda não conseguiu recursos para a montagem de sua exposição de longa duração que ocupará todo o segundo pavimento. Por isso, disponibilizamos no andar térreo um espaço grande que funciona como um “hall” de exposições, e nele, de tempos em tempos, renovamos com novos temas, dando oportunidade do público observar a extensão e a riqueza do nosso acervo.
No momento temos uma exposição intitulada “A escrita história, formas e usos”, que mostra o surgimento da escrita no Oriente Médio, indo até o final do século XIX. A cada módulo, mostramos como se deu e se desenvolveu a escrita nas diversas culturas humanas dos cinco continentes.
Como apoiar e conhecer o Museu da Humanidade
As pessoas podem ajudar o IPHARJ com trabalho voluntário, durante o período em que o espaço organiza eventos.
A instituição também aceita doações para manter o Instituto funcionando, que pode ser feita via Pix (chave nº de celular): (21) 99704-9415. Também é possível contribuir com produtos de limpeza e alimentos que serão usados nos lanches oferecidos ao final das atividades realizadas no IPHARJ e no Memorial da Humanidade.
Para agendar eventos e visitas para colégios ou grupos de 10 a 30 pessoas, o contato pode ser feito via e-mail (ipharjeventos@gmail.com) ou pelo WhatsApp, no número (21) 99188-4880.