Nega Fulô: a boneca negra criada por ativista para empoderar meninas

Nega Fulô é uma boneca preta criada pela paulistana formada em Administração e Publicidade, Andrea Ramos.

05.09.23

A ideia de criar uma boneca negra nasceu em 1998 a partir de um impacto muito grande, causado por um presente que Andrea recebeu de um namorado na época: uma boneca preta. Ela conta que a boneca tinha uma boca grande, a cabeça cheia de trancinhas e os olhos bem vivos e pretos como os dela e se destacavam sobre o fundo branco parecendo jabuticabas. Ela ficou impressionada. 

Na ocasião Andrea tinha em torno de 20 anos e esse episódio fez com que ela voltasse a sua infância distante e por sua vez, se questionar o porquê de ela nunca ter possuído uma boneca negra enquanto criança. 

Na fase adulta, quando ganhou uma de presente, ela pensou: “tenho que fazer alguma coisa com isso. Se isso me impactou dessa forma, me trouxe tantos questionamentos, tenho que dividir isso.” E Andrea se perguntava: “por que não tinha bonecas pretas nas lojas? Por que as bonecas pretas não pareciam nos comerciais na época de Natal, Dia das Crianças para que as pessoas tivessem a opção de comprar uma para presentear alguém?”.

Falta de representatividade na infância

Ela diz que durante a infância, teve várias bonecas, todas brancas e com todas ela brincava de mamãe e bebê, era como se fossem filhas dela e nenhuma tinha suas características. Mas não eram menos amadas. 

Mas elas eram impostas pela mídia e pelo mercado e por outro lado, não sentia falta de uma boneca preta por que é impossível sentir falta do que nunca se viu e seus pais não tinham a ideia, a sensibilidade de perceber que aqueles produtos não tinham as suas características.

“Talvez se eu não tivesse ganhado esse presente, talvez eu nunca me desse conta do fato de não existir bonecas pretas”. Então Andrea pensou que precisava fazer alguma coisa a respeito e também chegou à conclusão que não poderia só ela ter uma boneca preta. Imaginou que assim como aconteceu com ela isso iria impactar muitas outras pessoas e essas pessoas também perceberiam que não tiveram uma boneca preta na infância.  

“O passado não podemos mudar, o futuro sim e estava em minhas mãos”, diz Andrea. Então paralelamente ao seu trabalho, Andrea começou a procurar pessoas que pudessem fazer bonecas para ela, pois ela não tinha a menor ideia de como confeccionar. Ela queria espalhar bonecas pretas pelo mundo, queria que as crianças nascessem já com uma, que os enfeites nas portas das enfermarias das maternidades fossem bonecas pretas.

Ela conseguiu fazer isso e foi maravilhoso, diz ela.  A reação das pessoas e dos médicos era de espanto e encantamento, mas Andrea pensa que era para ser comum. Essa reação lhe trouxe muitas inquietações e ainda traz.

Dificuldades para produzir uma boneca negra

Na época não tinha pessoas nem indústrias que produzissem bonecas pretas e as pessoas estranhavam quando ela perguntava e procurava por elas nas feirinhas de artesanatos ou em eventos.

Passado um tempo as coisas começaram a acontecer, Andrea começou a participar de feiras de artesanatos em praças, em clubes, em universidades já com suas bonecas. Então veio a Lei 10639, que tratava do ensino da história africanas nas escolas. Depois ela foi substituída pela  Lei 11645. 

Nesse ínterim, várias escolas começaram a procurá-la na intenção de adquirir bonecas negras para fazer parte das brinquedotecas e também para trabalhar a Lei 10639, porque os professores ainda não tinham referências para passar para os alunos e foi então que Nega Fulô começou a andar através da educação.

Andrea fala sobre a boneca Nega Fulô 

“A Nega Fulô é uma ação de representatividade, de identidade mesmo, e eu sei que impactei muitas mulheres negras, que hoje produzem também bonecas negras e eu acho que temos que povoar o mundo, pois pessoas negras e não negras precisam conhecer a história. É pela igualdade racial, é pelo nosso lugar de merecimento, é por uma autoestima mais elevada das nossas crianças negras. Por isso nunca vou parar de fazer bonecas negras”.

A escocesa Fiona Roy, moradora de Coimbra, Portugal, fala sobre a reação de Kira Sofia Gomes, sua filha de 06 anos, ao receber uma Nega Fulô de sua madrinha.

“Minha filha ficou encantada quando recebeu a boneca de presente. Adorou sobretudo a cor da pele, o cabelo igual ao dela e o sorriso enorme. Ela está numa altura da vida em que já percebe a cor e a raça. É extremamente importante que ela tenha brinquedos que pareçam com ela e com nossos amigos. Ela ficou completamente colada com a boneca dia e noite desde que a recebeu! ”

Quer adquirir uma boneca negra?

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Neuza Nascimento
Após ser empregada doméstica por mais de 40 anos, Neuza fundou e dirigiu a ONG CIACAC durante 15 anos. Hoje é estudante de Jornalismo e trabalha com escrita criativa, pesquisa de campo e transcrições. No Lupa do Bem, é responsável por trazer reflexões e histórias de organizações de diferentes partes do Brasil para a "Coluna da Neuza".
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